Aproximar o Sistema Financeiro das Mulheres Empreendedoras nos Meios Rurais
Abril 2024
A escassos dias da celebração do Dia da Mulher Moçambicana, o projecto +Emprego, financiado pela União Europeia e co-financiado e gerido pelo Camões IP, juntamente com a Confederação das Associações Económicas (CTA) realizou esta sexta-feira, 5 de Abril, uma conferência sobre o papel da mulher nos negócios, com o objectivo de reflectir sobre os desafios enfrentados, com especial enfoque na questão do financiamento.
Na ocasião, durante o seu discurso, a fundadora da ONGD Kutsaca, um modelo de capacitação orientado para a inclusão e a sustentabilidade, Susana Cravo, falou dos desafios que as mulheres empreendedoras, principalmente as que residem em zonas rurais, enfrentam para desenvolverem os seus negócios, apontando a necessidade de existirem mais pontes entre as instituições financeiras e todas estas pessoas.
De uma forma geral, a responsável começou por explicar que “os desafios enfrentados pelas mulheres, sobretudo as que estão nos meios rurais, começam sempre na questão cultural, na pressão familiar e nas gravidezes prematuras. Às vezes, mesmo tendo uma conta bancária em seu nome, criar o seu próprio projecto ainda constitui um desafio para quem está numa sociedade patriarcal”, assinala, complementando que as mulheres empreendedoras “podem até conseguir um apoio financeiro, mas, para terem uma conta bancária, são necessários documentos que, como se sabe, muitas vezes nos meios rurais as pessoas não têm”. E rematou: “diria que há aqui espaço para uma aproximação entre as instituições financeiras e todas estas mulheres dos meios rurais para que estas consigam abrir a sua conta bancária e ter acesso aos produtos financeiros disponíveis enquanto empreendedoras”, assinalou.
Esta é uma observação partilhada pela coordenadora do projecto +Emprego, Cristina Paulo, para quem “a banca mais convencional ainda está longe das mulheres empresárias, sobretudo das que residem nas zonas rurais. As instituições financeiras, infelizmente, dirigem-se, sobretudo, às mulheres urbanas, às que vivem nas grandes cidades. As empreendedoras não urbanas não têm possibilidade de ir à procura da informação, portanto, diria que há aqui um caminho a percorrer por parte das instituições financeiras para se aproximarem delas”, assinalou.
Cristina Paulo classificou o evento como “positivo”, deixando, porém, uma observação: “há necessidade de chamar mais instituições além da banca para estas discussões, pois este deve ser um esforço colectivo, pelo que seria útil ouvir também outras ideias”.
Já a vice-presidente da CTA, Conceição Abdula, referiu que o organismo tem levado a cabo algumas iniciativas com vista a promover os negócios geridos por mulheres, com destaque para o lançamento do projecto “CTA-Mulher Empresária”, que inclui uma plataforma digital para a promoção de negócios geridos por mulheres, com o objectivo principal de dar maior visibilidade, divulgar oportunidades de negócio e de financiamento, concorrendo, assim, para promover o estabelecimento de parcerias e reduzir a assimetria de informação sobre oportunidades.
“A CTA tem desenvolvido projectos que conferem primazia às mulheres, enquanto beneficiárias de oportunidades de negócio, sendo de destacar os projectos de fortalecimento das capacidades das cadeias de valor agrícolas, em parceria com o Banco Africano de Desenvolvimento (BAD) e o projecto +Emprego, em parceria com o Instituto Camões”, disse a representante do sector privado no evento.
Maria Abdula acrescentou ainda: “acreditamos que, ao promover negócios e ao reduzir as assimetrias de informação sobre oportunidades, as mulheres poderão participar plenamente no mercado empresarial e concorrer em pé de igualdade, mas também incentivar a diversidade e promover um ambiente empresarial mais dinâmico e competitivo”.
Em jeito de conclusão, a dirigente da CTA relembrou que uma das barreiras enfrentadas pelas mulheres empreendedoras é o acesso ao financiamento, na dificuldade da obtenção de empréstimos para iniciar ou expandir os seus negócios, o que pode limitar a sua capacidade de crescimento. “Além disso, as mulheres enfrentam também dificuldades de treinamento e apoio técnico, o que dificulta ainda mais o início de um negócio. O estereotipo de género é outra preocupação”, anuiu.
De referir que a Kutsaca é uma organização de capacitação co-criada e co-gerida com a comunidade de Bilene que, em conjunto, promove iniciativas locais. Começou por ser uma ‘escolinha’ para as crianças em 2014, dada a inexistência de respostas para a educação de crianças dos 3 aos 5 anos na altura. A partir daí, passou a lidar com crianças dos 6 aos 9 anos, tendo evoluído para um programa de empoderamento da mulher em 2017 e, hoje, tem já um trabalho conjunto com jovens – o Clube dos Embaixadores.
O projecto +Emprego, com duração de quatro anos (Dezembro de 2020 a Dezembro de 2024), e financiamento de 4 milhões de euros, visa aumentar as oportunidades económicas da população de Cabo Delgado, especialmente dos jovens, contribuindo para a melhoria do acesso ao trabalho decente e do rendimento.
Fonte: Diário Económico, Abril 2024