Arquétipos na Ecopsicologia
Dezembro
Arquétipos na Ecopsicologia
Introdução e Contexto
Trago-vos uma incompleta Cartografia dos Arquétipos na Ecopsicologia, que se propõe a mapear alguns comportamentos, narrativas e posicionamentos, vistos como normais e mesmo desejáveis, mas que condicionam e limitam as práticas e teorias de Ecopsicologia. Comportamentos que são prejudiciais, que se baseiam nas perspectivas eurocêntricas modernas.
Esta cartografia foi directamente adaptada do artigo de Anna Denardin, Christina Sayson, Luiza Oliveira e Samantha Suppiah, “The Sustainability Industry’s In-built Asshole Culture,” tendo sido originalmente criada para o curso de Possible Futures, Introdução à Sustentabilidade Decolonial. Ao encontrar este trabalho senti muita ressonância com as várias máscaras presentes na prática da Ecopsicologia, daí que o tenha traduzido e adaptado. Segundo as autoras, os comportamentos nocivos listados foram inspirados nos vídeos de Heather Luna, no trabalho de Tema Okun sobre a cultura da supremacia branca e, claro, na experiência pessoal e colectiva da equipa Possible Futures. Nesta adaptação adicionei, no final do artigo, as questões e referências trazidas pelo “Rude Diagnostic Exercise” do GTDF, numa tradução e adaptação experimental que elaborei para mini-livro de Siduri, sobre a personagem de Gilgamesh como representante arquetípico da psique ocidental.
Esta Cartografia dos Arquétipos na Ecopsicologia está assente na observação dos padrões de limitação e fragilidade da psique eurocêntrica moderna; psique que encontra muita dificuldade em maturar para além do individualismo antropocêntrico, justificando-se no topo da hierarquia e sistemas de conhecimento ocidental, mas fechados nas suas narrativas da “verdade” ou do “normal.”
Relativamente a estes padrões nocivos, Joan Tronto traz a ideia de irresponsabilidade privilegiada (cumplicidade e não-inocência) que, somada às epistemologias da ignorância (um exame da complexidade na produção e manutenção da ignorância), dá pouca oportunidade e espaço à psique eurocêntrica para observar e se responsabilizar por toda a violência e consequências brutais do conforto da Modernidade. É mais fácil dissociar e seguir o brilho e as ilusões do excepcionalismo, do que relacionar afectiva e responsavelmente.
A Cartografia dos Arquétipos na Ecopsicologia é uma proposta e convite à maturação responsável e carinho intergeracional e mais-que-humano, e não é sobre o nosso valor, ou (de)feitos individuais —é exactamente a mudança de pele do individual, abrindo ao colectivo, com o inevitável Luto sobre as nossas confortáveis ilusões individualistas. Uma das questões elaborada pelo GTDF com Vanessa Andreotti, que ancora esta reflexão é: “Como o reconhecimento destes padrões, e as dificuldades de os compostar, podem servir de alavanca para iniciar uma forma de sobriedade emocional, maturidade relacional, discernimento intelectual e responsabilidade intergeracional?”
Por outro lado, as autoras, Anna Denardin, Christina Sayson, Luiza Oliveira e Samantha Suppiah, dizem: “Conhecermo-nos profundamente significa que reconhecemos os padrões insidiosos de dano dentro de nós próprios e dos outros, e procuramos desenvolver o hábito de nos apresentarmos de forma mais adequada e eficaz a qualquer que seja o trabalho. Significa que pedimos respeitosamente ajuda quando necessário, admitimos humildemente quando não sabemos o que estamos a fazer e reivindicamos graciosamente as nossas capacidades quando sabemos.”
Então, e seguindo a proposta do artigo original, a Cartografia dos Arquétipos na Ecopsicologia é também uma bússola, que nos ajuda a detectar padrões nocivos de máscaras que usamos sem sequer nos apercebermos. A tomada de consciência destes arquétipos que habitam em nós convida e permite o acolhimento e a possibilidade de decadência das infraestruturas que oprimem a nossa imaginação e nos mantêm encarcerados numa cultura imatura, plena de ilusões auto-congradulatórias de excepcionalismo e escapismo.
Desde a Antiguidade que as máscaras são usadas em processos sagrados de conexão e transmutação, mas também de proteção e evocação, mas hoje em dia são vistas como algo que contém ou esconde. No entanto, as máscaras são também materializações de arquétipos, os assumidos e os invisíveis (as máscaras que usamos sem saber.) Esta cartografia é sobre estas últimas, as máscaras validadas e desejadas no âmbito da Ecopsicologia, pela cultura que nos enforma, mas não necessariamente assumidas. Representam a sombra cultural.
É importante clarificar que o que pretendo trazer são várias formas de como a nossa Psique Ecológica é limitada nas possibilidades de encontro e co-participação, na experiência diária de crítica, sonho, decisão e reflexão.
Aqui trago a contra-narrativa cultural e decolonial, sustentada pelo braço critico da Ecopsicologia proposto por Andy Fisher e Jeanine M. Canty, levantando véus e abrindo espaço à passagem a outras possibilidades de relação e de “ser humano.”
Cada uma das seis máscaras descritas faz um bypass e evita abraçar a Ecopsicologia que, ainda que esteja assente em valiosos ensinamentos indígenas (na maioria não reconhecidos e mesmo totalmente invalidados) é um produto da modernidade e fundamentado pela mente eurocêntrica. São várias as máscaras que negam, de diferentes formas, que o “bem-estar humano não é a medida de todas as coisas,” assim como a real cumplicidade do capitalismo, (andro)antropocentrismo e individualismo no imenso desafio de abertura à relação recíproca com o mais-que-humano. São várias as máscaras que, pelo seu narcisismo intrínseco e cultural, negam a capacidade de resposta do Outro, ou a subjectividade multidirecional da nossa presença biológica e eco-sistémica. Negligenciando a responsabilidade e a necessária maturação da psique ocidental moderna.
Cartografia dos Arquétipos na Ecopsicologia
Experimentar as Seis Máscaras
As seis máscaras arquetípicas falam de vários posicionamentos (contextos, acções e crenças) relativamente à prática ecopsicológica: como profissional e recipiente.
Ao ler as descrições de cada máscara, considere até que ponto se alinha ou identifica com os comportamentos apresentados. É possível ver facetas de si próprio em várias máscaras. As autoras do colectivo Possible Futures referem: “Se se sentir desconfortável, ofendido ou tiver uma reação forte a qualquer um dos arquétipos, isso pode ser um alerta que se pode identificar com um padrão de comportamento num arquétipo. Preste atenção, observe as suas próprias reacções à descrição destas personagens e procure investigar mais profundamente.”
Máscara 1 – Isa – CEGUEIRA AO PRIVILÉGIO, REIVINDICAÇÃO DE INOCÊNCIA, PERTURBAÇÃO ESPIRITUAL
Máscara 2 – José – PROCURA DE RECONHECIMENTO, ACUMULAÇÃO DE PODER, EGO INFLAMADO
Máscara 3 – Luísa – SALVADORISMO, PATERNALISMO, VITIMIZAÇÃO
Máscara 4 – Daniel – ALIMENTADO PELA CERTEZA, EFICIÊNCIA, OBJECTIVIDADE
Máscara 5 – Jonas – CRÍTICA IGNORANTE, IMATURIDADE, APROPRIAÇÃO
Máscara 6 – Soraia – PERMANECER NA ZONA DE CONFORTO, DEFENSIVA, EVITAR CONFLITOS
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Fonte: Sofia Batalha I www.serpentedalua.com