O Desejo de Reconciliação, de Regressar a Casa e as Histórias que Contamos

Agosto 2023


Estabeleceu-se o dia 9 de Agosto como o Dia Internacional dos Povos Indígenas.

Este é um excerto de uma carta escrita por Bayo Akomolafe em 2016, que me parece servir como uma luva para este dia:
 

“Suspeito, de facto, que esta noção de indigeneidade como uma identidade fixa, como um estado de coisas estático, como algo a que se deve regressar, é, ela própria, um produto forjado pelo conhecimento branco. E com isto quero dizer que ninguém sabe o que significa tornar-se indígena. Nem mesmo os "indígenas".

Deixem-me contar uma pequena história que pode ser útil.
 

Há muito tempo, alguns dos vossos pais dividiram o mundo em dois reinos - um reino da aparência e um reino da permanência. Os ecos desta cisão radical no coração das coisas ainda ressoam atualmente. Vivemos em binarismos. Nós contra eles. Linguagem versus realidade. (…) Mente versus matéria. Eu versus ambiente. Livre arbítrio versus determinismo. Humano versus não-humano. Homem versus mulher. (…) Consciência versus mundo. (...) No contexto desta bifurcação, algumas coisas passaram a ser vistas como "originárias" ou superiores e outras, "derivadas" ou inferiores.

Os rumores desta grande cisão, deste radicalismo fora de jogo, infiltraram-se em quase tudo, e todos nós ficámos possuídos por um desejo de reconciliação. De embodiment. De regresso a casa. Esperávamos que - como os santos - quando marchássemos, num dia longínquo de arrebatamento pessoal ou coletivo, conheceríamos as coisas como elas realmente são. Estaríamos finalmente em contacto, e então seríamos verdadeiros.
 

O indigenismo tem a infeliz dignidade de suportar o peso destas expectativas civilizacionais e onto-epistemológicas. Tal como a "natureza". Tal como os artistas e teólogos do Iluminismo na sua busca de fundamentos puros, aprendemos a falar da "natureza" como se fosse um lugar de chegada incontestado. Um lugar desprovido de conflitos. Um lugar de conjuntos psicadélicos, de fractais harmoniosos. Um paraíso - onde se pode explorar um campo verdejante de árvores, dobrar um ramo para trás e, de alguma forma, escapar (em virtude de se estar no paraíso), ao efeito de ricochete e à cicatriz na pele.

Esta "natureza com uma auréola", ou a natureza como essencialmente "boa", cega-nos para as muitas formas como a "natureza" se desconstrói a si própria.”
 

Excerto de “Dear White People”, Bayo Akomolafe

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